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Décimo andar. Até meu suspiro ecoou pela cozinha do apartamento. Parece tão vazia quanto a minha alma perdida em um mundo para o qual me arrastaram. Copos em cima das gavetas e livros que nunca terminei de ler, jogados na estante. Cenário nada propício. Minhas pernas meio exaustas me impulsionavam para um contato direto com a cama, não ousaria resistir a nada que me proporcionasse conforto agora. Na cabeça, além de fios longos e embaraçados, uma dor interna que latejava e, lembranças. O meu dia estava cinza o bastante e então, procurei por algo que nunca achei que iria dar falta: segurança. A segurança pra fazer de mim forte, do ócio uma oportunidade, da ausência um combustível.  Alguma transformação.

Pela primeira vez na vida, eu senti que precisava fazer diferente naquela noite e resolvi não me entregar ao fluxo dos escombros para onde os meus pensamentos me levavam. E caminhei de olhos fechados e passos leves em direção à coragem. Porém, antes senti vontade de vomitar tudo: a saliva, os goles d’água quentes que bebi, as angústias que deixaram a minha garganta seca, a amígdala, os medos e o apartamento de milhões de metros quadrados vazios que virou o meu peito. Tudo de uma vez só. E como se ela fosse um perfume barato, respinguei sem dó a esperança no meu corpo, pra tentar disfarçar a ausência, a falta e a saudade.

A vida é um tanto quanto cretina e engraçada, o fato é que, não é realidade se não tem choro engasgado, dor no peito e vontade de voar ao mesmo tempo. O modo como nos adaptamos a ela nem sempre está ao nosso alcance, mas é preciso busca-lo se quisermos ultrapassar algumas fases. Se adaptar à alegria, à tristeza, à situação. No fim nos adaptamos, mas é genericamente difícil. Não diria que se adaptar à solidão é algo com o que eu terei que lidar o resto dos meus dias, mas pelo modo melancólico como essa palavra soa, nada mais normal do que sentir medo.

Eu nunca consegui aprender a lidar com o mal necessário, com despedidas, e principalmente, com ausências. De alguma forma natural, fui aprendendo que em minha condição o que eu não poderia, era me acomodar a não tentar. E percebi que as emoções que sustento, se parecem um pouco com fantasia. Quando passam, eu volto a viver de superfícies, e a elas me alinho e inevitavelmente, me adapto.

E assim voltei à minha zona de indecisão e suspirei antes de escolher o próximo livro que iria deixar pela metade. Desativei o despertador que me salva de não perder as aulas da universidade e iniciei um novo ciclo para a minha coleção. Observei o que dentro de mim era goteira e num instante de distração eu estava sorrindo ao perceber minhas roupas ao avesso. Me senti como se tivesse que desenformar o mundo, talvez seja eu o excesso de tudo que não se deve ser para manter o que se quer, é sensação que me causa vertigem. Eu não sei quanto tempo isso irá demorar pra passar, mas existem alguns atalhos que pretendo seguir para conseguir.

Entre eles, agora, o capítulo I.